Os Miseráveis, filme de 2019
“Lembrai-vos sempre de que não há ervas daninhas nem homens maus:
- Há, sim, maus cultivadores.”
Les Misérables, Victor Hugo
Esta frase surge no final do filme, mas resume-o na perfeição.
A problemática do filme, é transversal a todo o mundo, não é nova, não é desconhecida, mas é sistematicamente ignorada por todos. A segregação racial vivida nas (nossas) grandes cidades, como uma guetização social pós-colonial.
A organização social que temos nos países desenvolvidos gera: problemas sociais, consequentemente criminalidade; discriminação e segregação, com um fosso cada vez maior e mais difícil de reverter entre “classes”; um discurso de eles e nós que estranho e não aceito. Vivemos numa sociedade organizada e estratificada pelo sítio onde vivemos, a escola onde estudamos e as pessoas com quem nos relacionamos, a bolha que nos produz.
Este filme é sobre isso, os diferentes produtos dos bairros sociais que são barris de pólvora, onde não há certo nem errado, mas sobrevivência. Tanto as personagens como a narrativa são quase exclusivamente masculinas. Tem excelentes representações, onde se destaca Djebril Zonga, um perfeito desconhecido, com uma representação irrepreensível e uma presença magnética. A narrativa mostra a organização policial e marginal destes bairros, onde todos vivem à margem da realidade de outros locais, com dinâmica própria, numa espécie de equilibro disfuncional.
Até que um pequeno acontecimento é a faúlha que acende aquele barril de pólvora. Uma criança rouba um leão bebé de um circo, gera uma tensão entre grupos, a polícia tenta resolver esse problema para manter o local funcional. A intervenção policial com uma ação errada, seguida de um conjunto de decisões ainda piores, faz despoletar a violência latente.
Este é um drama social, uma descrição de dentro para fora e um excelente ponto de partida para uma reflexão sobre o que queremos deixar para trás. Que Homens produz a nossa sociedade? Temos a geração a mais informada de todos os tempos, mas a menos reflexiva e crítica. A que age atrás de um ecrã, mas isso não se reflete no quotidiano. Seremos a geração mais egocêntrica e menos empática da história da humanidade?!