Sobre discriminação
Na nossa lua de mel, na Escócia, num dos locais onde estivemos hospedados enquanto percorríamos o país, estávamos os dois na entrada do hotel depois de jantar. No mesmo local estava um grupo de mulheres que discutiam o quão exóticos éramos, em inglês com a estúpida arrogância de acharem que ninguém os percebe, acabando a conversa com "Ele até é bonito, mas ela é igual às empregadas de limpeza." Quando sou uma miúda bem gira, morena de cabelos escuros, olhos escuros e amendoados. Bem mais bonita que a maioria das inglesas, com a vantagem de nunca ter apanhado um escaldão na vida:)
Antes tínhamos jantamos num restaurante típico e falávamos português entre nós, enquanto todas as mesas nos olhavam e faziam conjecturas sobre a nossa nacionalidade. Quando o Vicente tirou o casaco tinha vestida uma T-shirt le coq sportif, na mesa ao lado estava um casal relativamente novo e o senhor gritou em êxtase: São Franceses! Agora pensem que falamos sempre português entre nós e inglês com eles, mas aquelas cabeças estão cheia de preconceitos e não foram muito espertos.
Em Edimburgo, fui retida no aeroporto. Abriram-me a bagagem, cremes, computador e fizeram-me algumas perguntas enquanto o meu marido já estava noutro local.
Visitamos Paris em dezembro de 2010, estava muito frio e fiquei bastante doente, para proteger as "entradas de ar" cobri a boca e o nariz com o cachecol. Imediatamente fui olhada com medo e desconfiança. Na altura até brincamos com isso, mas depois pensamos: já imaginaste como é viver assim todos os dias?!
Agora em: PORTUGAL.
No Porto, num restaurante de topo mas não tão bom assim, onde éramos os únicos portugueses, fomos analisados como animais exóticos. Na mesa ao lado discutiam: a nossa roupa, os acessórios, as nossas escolhas do menú e o estrato social a que poderíamos pertencer. Para eles não era suposto haver portugueses alí, porque para eles somos pobres e servimos. Realmente era final de ano e aquele tinha sido o meu presente de Natal, era suposto ser um momento especial e raro, para os nossos padrões económicos. Mais uma vez falavam inglês ao nosso lado, eles invasores no meu país. Na Madeira foi ainda pior, os ingleses portam-se como colonizadores, pisam o chão com autoridade e têm locais exclusivos.
A prova que somos um país que se mistura é que temos: portugueses de cabelos e olhos claros, como temos portugueses de cabelos e olhos escuros; como temos portugueses castanhos escuros, castanhos claros ou de olhos em bico. E isso é incrivelmente bom, só percebemos como somos certos quando nos cruzamos com o errado.
O pior é que reagi levemente, lançando olhares de reprovação, mas nunca fortemente como era meu direito. Hoje arrependo-me disso e seria bem diferente. Nós temos de tratar como gostamos de ser tratados em todos os lugares, mas acho que só percebemos como se sente alguém discriminado quando somos o alvo.
Moro num bairro multi-cultural, o único por estes lados, recebo sempre uma cara de espanto quando digo "Bom dia ou Boa tarde" às mulheres e aos miúdos de outras etnias. Isso só mostra a crueldade das pessoas, como são ignorantes e que nunca sentiram discriminação; por isso discriminam, porque simplesmente nunca viveram fora da sua zona de conforto.
Cabe-nos a todos combater e evitar comportamentos discriminatórios, começando por nós próprios. Falar e apontar o dedo a quem se comporta assim, a quem defende publicamente - sem se envergonhar - o que está errado.